Geral Opinião

Notas em torno da designação de colónias ou de províncias ultramarinas

Observador

Sendo um militar do quadro permanente duma geração que não foi à guerra, e considerando-me politicamente um não extremista que advoga, como dizia Aristóteles, que o caminho do meio é o caminho correto, o caminho dos moderados, parto para esta análise duma forma o mais descomprometida e o mais isenta possível, não querendo ferir suscetibilidades, mas pretendendo ser racional, pondo de parte o fator emocional.

A descolonização portuguesa, termo semântico a que ninguém normalmente se opõem, pois os territórios fora de Portugal Continental eram colónias de facto, embora não de jure devido a uma habilidade jurídica, ainda hoje divide a sociedade portuguesa, não só por ter sido feita atabalhoadamente, mas pelo facto de acharmos, como achamos sempre, que tudo o que fizemos ou fazemos nunca tem ou teve a ver com interesses, mas por outros factos estranhos que nos desculpabilizam, tais como o facto da nossa colonização ter sido diferente das outras, algo que é uma mistificação da História.

Os militares que combateram valentemente em África, fizeram-no com bravura na defesa dos interesses políticos do regime da altura, como era seu dever. Nada disto coloco em causa como militar e respeito-os por isso.

Foram também os militares que fizeram o golpe de estado no 25 de abril que derrubou o regime e que deu origem à descolonização, sendo que uma das razões que esteve na base do 25 de abril foi o cansaço da guerra.

Por tudo isto não consigo perceber a polémica existente sobre a designação da guerra, em que os militares mais conservadores designam por guerra de África ou guerra ultramarina e os outros designam por guerra colonial, pois considero que:

1- Cinquenta anos não é tempo suficiente para se poder analisar a história pátria deixando de lado os traumas e as emoções.

2- A narrativa de Salazar relativamente à revogação do ato colonial e à subsequente alteração da constituição designando por províncias as até então colónias, para justificar a guerra e evitar a condenação inevitável na ONU, ainda hoje é defendida.

3- As condenações da ONU tenham pesos diferentes, ou seja, no caso da invasão da Ucrânia a Rússia está a fazer uma guerra ilegal, no caso português essa condenação era desprezível. Em termos de argumentaria a narrativa russa também está a atuar num território historicamente seu e a defender a população russófona. Não podemos ter dois pesos e duas medidas, quando analisamos o fenómeno da guerra

4- Na altura fizemos uma guerra contra povos autóctones que se fossem realmente considerados portugueses hoje podiam entrar livremente em Portugal e conseguir diretamente a nacionalidade portuguesa porque eles são portugueses de facto, por terem nascido numa província portuguesa, ou serem descendentes de portugueses, não seriam necessários vistos. Não foi isto que sucedeu na altura da descolonização, em que os retornados eram maioritariamente brancos, nem atualmente.

Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

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