Arte & Cultura Geral

Dois dedos de poesia, Celeste e os cravos

“No dia 25 de Abril de ‘74 havia em Lisboa um restaurante que celebrava o primeiro aniversário. Era um self-service, chamado Sir, que ficava no Edifício Franjinhas, na Rua Braamcamp. Por ocasião do aniversário, o dono do estabelecimento quis ter um gesto de amabilidade para com a clientela: oferecer uma flor às senhoras e um cálice de Porto aos senhores. Para o efeito encomendou vários molhos de cravos – vermelhos e brancos –, já que era essa a flor mais disponível na época. Porém, dado que naquela quinta-feira havia uma revolução nas ruas, quando os empregados se apresentaram para trabalhar foi-lhes comunicado que o restaurante não abriria e que deveriam, cada um, levar um molho de cravos para casa, para que estes não murchassem sem qualquer utilidade. Foi isso que fez Celeste Caeiro, uma das empregadas do estabelecimento.

No regresso a casa, Celeste parou no Rossio, para espreitar o que se passava. Chegou perto de uma chaimite que estava estacionada junto à Tabacaria Caravela, no início da Rua do Carmo, e perguntou a um soldado há quanto tempo ali estava. Ele respondeu que desde a madrugada e aproveitou para pedir um cigarro. Ora, Celeste Caeiro, que não fumava, não tinha cigarros, mas não quis deixar de oferecer alguma coisa ao soldado e deu-lhe um dos seus cravos. O rapaz colocou a flor no cano da espingarda e não demorou até que outros quisessem imitar o gesto. Foi então que Celeste começou a distribuir cravos pelos soldados que estavam por perto. A ideia pegou e pouco depois as floristas da Baixa estavam a oferecer cravos a todos os militares que ali andavam. Ao fim do dia a cidade estava inundada daquelas flores. Sem querer, Celeste tinha criado um ícone e baptizado a Revolução dos Cravos.”

Este foi um dos episódios que o grupo Tema contou na cronologia de acontecimentos, antes, durante e depois do dia da revolução, uma curiosidade que pelo menos eu desconhecia.

Entre músicas que fazem parte do repertório da canções de abril, sal picadas de poesia e prosas, foi uma lição da nossa história recente.

Com excelentes interpretações a que este grupo já habituou o seu público, uma mistura momentos musicais encadeados com declamações, durante quase duas horas de espetáculo, terminaram com uma grande ovação da plateia esgotada.

Não retirando qualquer protagonismo ao grupo Tema, o grande momento da noite foi sem dúvida a ovação de agradecimento do público presente a alguns Capitães de Abril presentes na sala.

Com textos de Lourenço Henriques, direção musical de Miguel Nogueira e interpretações de Beatriz Silva, Lourenço Henriques, Margarida Alves Gato, Maria Campos, Ricardo Monteiro e Miguel Nogueira, mais um grande momento de cultura na Ericeira.

Texto e fotografia de Carlos Sousa/ KPhoto