Geral Opinião

A França sempre teve razão em relação à autonomia da UE

A França, o único país da UE com armamento nuclear próprio, e por ela fabricado, com a sua própria tecnologia, o que lhe permite ter alguma Capacidade de Dissuasão nuclear, que agora Macron decidiu estender ao espaço da UE, embora sob Comando e Controlo Francês, nunca deixou também de ter capacidades militares, e uma base industrial de defesa, para poder garantir a sua autonomia estratégica também em termos de guerra convencional, de acordo com o preconizado pelo General de Gaulle, que tinha sempre algum  “partie pris” contra a hipótese de confiar plenamente a sua defesa aos EUA através da NATO.

Essa desconfiança da França em relação à NATO, levou-a só a aderir à sua componente militar da organização em 4 de abril de 2009, aquando da Presidência de Sarkozy, embora mesmo na parte militar tenha mantido o seu planeamento de defesa autónomo para garantir a sua autonomia, coisa que Portugal abdicou completamente, conforme consta do nosso conceito estratégico.

Durante os anos em que trabalhei na UE, em desenvolvimento de capacidades militares, em todos os documentos que desenvolvemos, os Franceses pugnavam sempre por neles colocar sempre um conceito, ou uma palavra no sentido de garantir a autonomia da UE, ao invés dos britânicos, ao lado de quem Portugal invariavelmente votava, que neles invariavelmente queriam sempre colocar a palavra NATO. Conseguir arranjar um texto consensual no final era algo por vezes difícil de se almejar, pois os conceitos que informavam esses dois estados membros era paradoxalmente oposto, e a Presidência que os redigia os tinha que a muito custo o conseguir muito  diplomaticamente, nem que para o efeito demorasse por vezes uma semana a negociar um pequeno parágrafo.

Quando a Bélgica ofereceu um edifício, perto de Bruxelas, em Lacken para que a UE nele colocasse um Comando Estratégico próprio, os Britânicos opuseram-se categoricamente a esse desiderato, por já haver um comando estratégico da NATO na Europa, o SACEUR, tendo na altura eles, Portugal e os Países baixos a tal se oposto, e que falta ele nos fazia atualmente, com este afastamento da NATO que os americanos querem efetuar sob a Presidência de Trump.

Sempre que fui ao Pentágono, em reuniões bilaterais, EUA/ Portugal, e me reunia à parte, sozinho com os oficiais americanos que tratavam das relações NATO/UE, as questões que me colocavam sempre eram relativas às minhas opiniões, sobre o que eu pensava acerca das posições futuras dos franceses em relação ao desenvolvimento de capacidades autónomas da UE, no sentido de recolherem informações e me doutrinarem  por forma a ter uma opinião contrária à francesa, pois segundo eles os EUA eram um país Europeu e a NATO era uma forma de o afirmarem.

Agora que a UE e a maioria dos seus Estados membros parecem refletir alguma preocupação, pelo facto do abandono anunciado da Potência Protetora da Segurança Europeia, inclusive da continuação do seu treino operacional conjunto, espero que finalmente Portugal e os outros apoiantes indefectíveis da total dependência da NATO, como os Países Baixos e a Polónia, que substituiu cabalmente o Reino Unido nesse desiderato, finalmente percebam a necessidade de desenvolver capacidades europeias autónomas, e só espero que não seja tarde.

Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

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