Direito

Teletrabalho: O que mudou a 4 de Novembro de 2020

Em vigor desde 4 de Novembro de 2020, o Decreto-Lei n.º 94-A/2020, de 3 de novembro procedeu à alteração do Decreto-Lei n.º 79-A/2020, de 30 de setembro, quanto ao regime excecional e transitório de reorganização do trabalho e de minimização de riscos de transmissão da infeção da doença COVID-19 no âmbito das relações laborais.

  • Em que situações o teletrabalho é obrigatório?
    O teletrabalho volta a ser obrigatório para todos os trabalhadores cujo local de trabalho ou residência se situe num dos 121 concelhos de maior risco de contágio da infeção da doença COVID-19. No entanto, não é suficiente este critério, sendo obrigatório que as funções exercidas pelo trabalhador sejam compatíveis com o desempenho em teletrabalho e que este disponha de condições para as exercer.
    Até à presente data, são considerados os 121 concelhos identificados no Anexo II da Resolução do Conselho de Ministros 92-A/2020, de 2 de Novembro. Nos termos deste diploma, os concelhos afetados são definidos em função da verificação de mais de 240 casos por cada 100 000 habitantes nos últimos 14 dias.
  • Quais as situações excecionais em que não se aplica o teletrabalho?
    O regime de teletrabalho obrigatório não se aplica aos trabalhadores integrados nos estabelecimentos de educação pré-escolar das instituições do setor social e solidário que integram a rede nacional da educação pré-escolar e nas ofertas educativas e formativas, letivas e não letivas, dos ensinos básico e secundário, ministradas em estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, incluindo escolas profissionais privadas.
    O regime de teletrabalho obrigatório não se aplica aos trabalhadores dos serviços essenciais, abrangidos pelo art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março. São considerados trabalhadores de serviços essenciais nomeadamente os profissionais de saúde, as forças e serviços de segurança e de socorro, os trabalhadores dos serviços públicos essenciais, de gestão e manutenção de infraestruturas essenciais, bem como outros serviços essenciais, sujeitos à mobilização para o serviço ou
    prontidão.
  • Qual o procedimento a adotar nos casos em que não é possível adotar o teletrabalho?
    Caso o empregador entenda não estarem reunidas as condições para aplicar o teletrabalho, este deve comunicar, fundamentadamente e por escrito, ao trabalhador a sua decisão, competindo-lhe demonstrar que as funções em causa não são compatíveis com o regime do teletrabalho ou a falta de condições técnicas adequadas para a sua implementação.
    Se o trabalhador não concordar com tal decisão, poderá solicitar à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) que verifique a legalidade dos factos invocados pelo empregador e, em consequência, se
    é aplicável o teletrabalho no caso concreto. O trabalhador tem um prazo de três dias úteis (após comunicação do empregador) para submeter a questão a apreciação do ACT.
    Em consequência, a ACT apreciará os fundamentos do empregador e a legalidade da decisão, tendo em consideração a atividade/função para que o trabalhador foi contratado e o exercício anterior da atividade em regime de teletrabalho. A ACT tem de tomar uma decisão num prazo de cinco dias úteis.
  • O trabalhador pode recusar o teletrabalho?
    Sim. Se o trabalhador considerar que não tem condições técnicas ou habitacionais para exercer as suas funções em teletrabalho, deve informar o empregador por documento escrito fundamentado.
  • O empregador é obrigado a disponibilizar todos os equipamentos de trabalho?
    O empregador deve disponibilizar ao trabalhador todos equipamentos de trabalho e de comunicações que sejam necessários para o exercício da atividade em teletrabalho. No entanto, quando tal disponibilização não seja possível e o trabalhador assim o consinta, a atividade pode ser exercida através dos meios que o trabalhador detenha, sendo obrigação do empregador a devida programação e adaptação às necessidades inerentes à prestação do teletrabalho.
  • Quais os direitos do trabalhador em regime de teletrabalho?
    O trabalhador em regime de teletrabalho tem os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores, em matéria de limites do período normal de trabalho, segurança e saúde no trabalho e reparação de
    danos emergentes de acidentes de trabalho ou doença profissional, não devendo existir qualquer discriminação entre trabalhadores. Acresce que o trabalhador mantém o direito a receber o subsídio de refeição que já lhe fosse devido.
    Realça-se, ainda, que o empregador deve respeitar o direito à privacidade e à reserva da intimidade da vida privada do trabalhador em teletrabalho, não sendo admissível, por exemplo, impor ao trabalhador que mantenha a câmara de vídeo permanentemente ligada. De acordo com a CNPD, também não será de admitir a possibilidade de gravação de teleconferências entre o empregador e os trabalhadores
    (exceto se todos os visados prestarem consentimento para tal).
  • Quem paga as despesas inerentes ao teletrabalho?
    Com o desempenho da atividade laboral em regime de teletrabalho, existem um conjunto de despesas que são habitualmente pagas pelo empregador e que com a transferência do local de trabalho para
    casa, passam a ser pagas pelo trabalhador (exemplo: consumos de água, eletricidade, internet, comunicações, etc.).
    Mais uma vez, o diploma é omisso quanto a quem pertence a obrigação de pagamento das despesas relacionadas com o exercício do teletrabalho. Na ausência de legislação especifica, deverá aplicar-se o estabelecido no artigo 168.º do Código do Trabalho, que regula o teletrabalho em geral, ou seja, “na falta de estipulação no contrato, presume-se que os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação utilizados pelo trabalhador pertencem ao empregador, que deve assegurar as respetivas instalação e manutenção e o pagamento das inerentes despesas.”
    Caso o trabalhador tenha um acréscimo de encargos com as despesas inerentes ao teletrabalho, deverá solicitar o pagamento das mesmas à entidade patronal, de forma mensal, através de prova documental
    que demonstre tais despesas e que estas advêm da prestação da atividade laboral em teletrabalho.
    No entanto, desde já alertamos que poderão existir situações de litígio e de oposição da entidade empregadora, pois caso não exista um acordo entre as partes e sendo esta uma situação imposta pela legislação em vigor derivada das atuais circunstâncias atípicas, vislumbra-se complexo estabelecer qual a percentagem e/ou limites que o empregador deverá pagar de eletricidade, internet, água, etc., tornando-se ainda mais difícil quando existam outros membros do agregado familiar neste regime.
    Entendemos que será necessário considerar as posições de ambas as partes. Numa perspetiva, o empregador não tem escolha quanto ao teletrabalho, é algo imposto pela legislação em vigor face à crise epidemiológica. Porém, em muitos casos, também este acréscimo de encargos para o trabalhador irá ter um grande impacto no orçamento do agregado familiar. Assim, somos da opinião que cada caso deverá ser analisado em concreto, aplicando-se, acima de tudo, os juízos da equidade e razoabilidade.

Andreia Catarina Cardoso

Advogada