Ao longo da história, as artes sempre dependeram de mecenas para florescer. Sem esse apoio vindo de príncipes, igrejas, Estados ou elites económicas dificilmente teríamos assistido ao desenvolvimento de tantas expressões artísticas que hoje valorizamos. O curioso, no entanto, é observar como os países africanos de expressão portuguesa (PALOP), possivelmente influenciados por antigas ligações à URSS e a modelos de Estado mais intervencionistas, mantiveram uma prática de mecenato institucional mais ativa do que Portugal.
Em muitos destes países, o Estado continua a assumir o papel de comprador e promotor de arte contemporânea, adquirindo obras para museus nacionais, palácios presidenciais ou eventos de representação oficial. Este investimento estatal serve, por vezes, como legitimação política, mas também como ferramenta de construção de identidade e projeção internacional. Assim se explicam, por exemplo, as presenças regulares de artistas como Guilherme Mampuya (Angola), Sebastião Coana (Moçambique), ou ainda Kwane de Sousa e Renée Tavares (São Tomé e Príncipe), em bienais internacionais, exposições de prestígio e programas culturais apoiados pelo poder político.
Todos estes nomes partilham algo em comum: foram, em maior ou menor grau, escolhidos ou promovidos pelos seus regimes como representantes da identidade artística nacional. A substituição dos painéis de Malangatana na Praça da Independência, em São Tomé por obras de outros artistas institucionalmente próximos, embora conservando os originais que foram musealizados, ou a representação repetida dos mesmos nomes nas grandes mostras internacionais, revelam uma estratégia deliberada de afirmação cultural ligada ao poder.
Em contraste, Portugal seguiu um caminho diferente. Apesar de um passado rico em produção artística, o país praticamente abandonou a política de compras públicas de arte contemporânea e de arte em geral, incluindo mobiliário de época para os palácios nacionais, nas últimas décadas, tendo o ano passado só adquirido duas obras no total . A ausência de uma política coerente de aquisição para museus ou edifícios do Estado revela uma fragilidade estratégica: A cultura é tratada como acessória, e não como vetor estruturante de soberania ou diplomacia cultural.
Esta negligência tem consequências. A falta de um ecossistema cultural robusto, onde o Estado assuma parte da responsabilidade de promover e preservar o património artístico do presente e do passado, compromete não só o futuro da arte portuguesa como também a sua capacidade de atrair turismo cultural de alto valor. Os turistas interessados em cultura procuram contextos com densidade simbólica e presença artística viva algo que se encontra cada vez mais em outras geografias, nomeadamente africanas.
Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

Adicionar comentário