Geral Opinião

Porque a reconstrução dos Estados não funciona com os Americanos

Tive três experiências distintas, duas de Cooperação Militar Portuguesa e uma de edificação dum Centro de Comando e Controlo ao nível governamental no Iraque, ou se quiserem três experiências no âmbito da Reforma dos Sectores de Segurança de três países diferentes, de diferentes realidades e culturas, tendo em todos eles tentado fazer a diferença com a minha presença.

Enquanto que em São Tomé e Príncipe fui recebido calorosamente pelos saudosos autóctones que me saudavam fardado, com expressões de visível alegria, e efusivas expressões orais que passo a citar, “Até que enfim, voltaram” , até à visível manifestação de desagrado com a minha presença à chegada ao Iraque com a NATO.

Em todas aprendi que tinha que ter disponibilidade para ouvir, depois de com eles ir paulatinamente ganhando confiança, e ter estabelecido amizade, sem nunca impor nada, ou seja. sem receitas pré-estabelecidos, que só conduzem ao insucesso.

Não é fácil, não vem em nenhum manual, nem ninguém infelizmente nos ensina, mas temos de os conhecer, jantar com eles macaco em São Tomé, ou mixórdias várias, que não sei o que eram no Iraque, que te provocavam nojo e desarranjos intestinais diários.

De caminho vais conhecendo a sua cultura, a sua família, a sua religião, enfim, começas a viver integrado, com quem vais cooperar. Ouvir muito, intervir pouco, muito pouco, é parte da chave do sucesso.

Nunca entrei em gabinetes, nem no Iraque armado, por ser uma falta de respeito, algo foi muito apreciado neste último país em especial, em contraponto com os militares americanos, sempre armados e desconfiados.

Exige paciência, dá trabalho, exige preparação, leitura prévia da história, rudimentos da religião, antes de viajar, mas é a única forma de trabalhar com civilizações distintas das nossas.

Considero que tive sucesso em todas elas, mas no Iraque, que foi a última missão, fiz amigos com Curdos, com Sunis e com Xiitas, ouvi queixas duns em relação aos outros, tentei ajudar a resolver problemas familiares deles, e acabei em amenas conversas com um chefe duma tribo com 10 milhões de pessoas, que se estendia desde o Iraque, até aos outros países do Golfo, enfim, respeitei e fui respeitado.

Sendo a minha missão avaliar o trabalho do Estado-maior e do Comando, onde estava a trabalhar, decidi dar-lhes a conhecer os “Check Lists” de avaliação, ajustei os “Check Lists” à realidade e tudo sempre em cooperação com eles, comecei a solicitar que se auto avaliassem, facto que começou a acontecer, o trabalho foi profícuo, foi feito com eles e para eles.

Aprendi muito, muitíssimo, despediram-se de mim em cerimónia pública, despediram-se individualmente em bicha pirilau quando saí, todos me abraçaram e beijaram no ombro direito, no último dia que fui ao trabalho, sinal de máximo respeito, que raras vezes têm com um estrangeiro. Com eles me despedi também chorando por deixar amigos.

Não há outra maneira de cooperar com outras civilizações, senão viveres, conviveres e ganhares a sua amizade e confiança.

Os EUA têm dinheiro, gastam, mas todos os odeiam, e os querem ver pelas costas o mais rápido possível, daí as animosidade e os fracassos sucessivos, que têm tido nas sucessivas intervenções que têm realizado.

Nuno Pereira da Silva

Coronel de Infantaria na Reserva