O recente sinal do Parlamento Europeu em favor de um “Schengen Militar”, que permitiria a livre circulação de forças armadas nacionais entre Estados-membros, não é um gesto ingénuo. Surge precisamente na véspera de uma Cimeira deliberativa da União Europeia, refletindo coordenação entre Parlamento, Comissão e Conselho, e não um movimento isolado.
À semelhança do Acordo de Schengen, este regime será voluntário. É mais um passo relevante na integração europeia, agora no domínio da defesa. Em tempos de paz plena, seria lento, mas a atual guerra híbrida acelera decisões que durante décadas foram adiadas.
Parte do processo já está em preparação, através do programa ReArm Europe, que financia infraestruturas para favorecer a mobilidade das forças armadas. Portugal tem feito levantamentos de pontes, estradas, portos e rampas de embarque navais e ferroviárias, alinhando-se com os restantes Estados-membros.
A realidade ferroviária portuguesa é um desafio, embora não insuperável. Durante a Guerra Fria, a Brigada Mecanizada Independente deslocou-se várias vezes de ferrovia, com unidades mecanizadas completas, para a região de Bari, em exercícios em que participei, testando efetivamente a capacidade nacional de mobilização. Ainda assim, em larga escala, Portugal depende sobretudo do transporte marítimo.
É por isso central que a União Europeia crie uma capacidade própria de aquisição de aviões de transporte estratégico, financiada em conjunto. Sem ela, qualquer Schengen Militar fica incompleto, dependente e vulnerável. A autonomia estratégica constrói-se com meios próprios, disponíveis e sob decisão política europeia.
Do mesmo modo, a persistência no investimento em infraestruturas ferroviárias em bitola ibérica, hoje sem justificação estratégica, limita a integração europeia e a mobilidade militar e civil, penalizando o acesso a fundos para infraestruturas de duplo uso.
É também necessário retomar a criação de um Comando Estratégico europeu e de um Comando Logístico permanente. Sem estas estruturas, a mobilidade das forças arrisca-se a permanecer um exercício administrativo, incapaz de gerar capacidade real de ação e decisão.
Nada disto será possível sem investimento comum significativo. A Cooperação Estruturada Permanente, embora útil em projetos específicos, não resolve desafios desta escala. O avanço terá de envolver todos os Estados-membros ou, alternativamente, aqueles dispostos a integrar uma União Europeia que funciona, na prática, a várias velocidades.
Não se trata de ideologia, mas de maturidade política ou a Europa assume plenamente a sua defesa, a sua mobilidade militar e a sua capacidade de decisão estratégica, ou continuará dependente e vulnerável. Num mundo que voltou a organizar-se pela força e dissuasão, a Europa só será levada a sério se for capaz de se defender e de agir por si própria.
Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma












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