Amanhã completo 63 anos. Idade que, em tempos mais serenos, seria sinal de maturidade e sabedoria acumulada. Mas não posso festejar — não com a consciência esmagada pelo que se passa diante dos nossos olhos, dia após dia, em Gaza.
Estou destroçado. A palavra é essa.
Assisto, como todos, à tragédia transmitida a preto e branco pelos ecrãs e pelas consciências. Só que isto não é cinema mudo. É genocídio em tempo real. O que se passa em Gaza ultrapassa em horror até os relatos bíblicos de Sodoma e Gomorra. Com uma diferença abismal: não estamos perante uma história simbólica contada para extrair lições de moral ou penitência. Aqui há um nome, um rosto e uma assinatura. Benjamin Netanyahu. Não é Deus. É um primeiro-ministro em funções, e o que está a fazer é inqualificável.
Desumana, cobarde, criminosa — nenhuma palavra basta para traduzir a extensão do mal perpetrado. O que vemos não é uma operação militar, nem sequer uma resposta desproporcionada. É um extermínio metódico, com objetivos políticos e territoriais, executado com frieza. Um dia, e esse dia há de chegar, Netanyahu terá de responder em Haia, perante o Tribunal Penal Internacional, pelos seus atos. Porque o que se passa não é guerra. É crime.
E, tragicamente, ele já nem responde ao seu próprio padrinho político. Donald Trump, num gesto de teatro geoestratégico, fala de um possível cessar-fogo de 60 dias. Netanyahu acena com a cabeça, mas prossegue os bombardeamentos, finge negociar com o Hamas no Qatar e, simultaneamente, prepara o rastilho para incendiar todo o Médio Oriente.
O plano é perigoso e calculado: apoiar um corredor curdo através da Síria, incentivando forças separatistas no Irão, Iraque e Síria, com o objetivo de desestabilizar esses regimes e provocar a Turquia, um aliado da NATO. Tudo isto num tabuleiro que ameaça arrastar a região inteira para o abismo.
Neste cenário sombrio, é com alívio que saúdo um gesto político corajoso. O presidente Emmanuel Macron anunciou hoje que a França apoiará oficialmente a criação de um Estado Palestiniano. É o primeiro chefe de Estado europeu a assumir essa posição com clareza e responsabilidade. Que outros o sigam. Que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, encontre finalmente a coragem de deixar de emitir comunicados genéricos e diga com todas as letras: há um culpado. Há um governo responsável. Há um povo a ser exterminado.
As gerações futuras perguntarão onde estávamos. Perguntarão por que calámos. E haverá quem tenha de responder.
Eu, na véspera dos meus 63 anos, não calo.
Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

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