Donald Trump voltou a ameaçar a União Europeia com tarifas suplementares caso Bruxelas insista em aplicar o seu arsenal normativo contra as Big Tech. Para ele, é uma questão de honra nacional: a América compra demasiado à Europa e vende pouco em troca. É um argumento simples, eficaz na sua narrativa de força, e que justifica o uso da tarifa como arma política. Na lógica trumpiana, o comércio é uma arena de pugilato onde quem compra mais perde, e onde é preciso repor o equilíbrio com medidas musculadas.
Do outro lado do Atlântico, a União Europeia enfrenta outro défice, mais subtil mas talvez mais perigoso: o défice tecnológico. Apesar da sua tradição industrial e da capacidade científica, a Europa não conseguiu criar gigantes digitais à altura dos Estados Unidos. Depende das suas plataformas, dos seus semicondutores, da sua inteligência artificial. Daí a aposta numa arma diferente: a lei.
Nos últimos anos, Bruxelas ergueu um arsenal jurídico de peso: o DMA (Digital Markets Act), o DSA (Digital Services Act), o AI Act, o RGPD (Regulamento Geral de Proteção de Dados), a Diretiva de Direitos de Autor e o Data Act. A isto somam-se ainda as leis fiscais digitais nacionais de alguns Estados-membros.
É precisamente este conjunto que está na mira de Trump, que acusa Bruxelas de discriminação contra empresas americanas e ameaça usar a Section 301 do Trade Act, o mesmo instrumento que justificou tarifas punitivas contra o Japão nos anos 80 e contra a China em anos recentes.
Mas a verdade é que esta luta dificilmente terá um vencedor.
• O mercado americano é vital para os bens europeus: automóveis, maquinaria, vinhos, farmacêutica.
• O mercado europeu é vital para os serviços digitais americanos: Google, Apple, Meta, Microsoft e Amazon fazem aqui parte essencial das suas receitas.
É uma relação de interdependência: Washington tem o músculo das tarifas, Bruxelas tem a força da norma. Um lado não pode dispensar o outro.
No fim, nem Trump nem a Europa podem dar-se ao luxo de perder esta batalha. A única saída será sempre o compromisso — porque, por muito que defendam cada um a sua dama, ambos sabem que não podem jogar sozinhos neste tabuleiro.
Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

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