*Artigo de Opinião da Dra. Belinda Oliveira, Anestesiologista do Hospital de Braga – Unidade de Dor Crónica do Hospital de Braga
De acordo com a “International Association for the Study of Pain” (IASP): “Dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a dano real ou potencial em tecidos, ou assim percepcionada como dano”. A dor é sempre um fenómeno subjetivo e cada indivíduo aprende o significado da palavra dor através de experiências com traumatismos físicos e emocionais ocorridos no início da sua vida.
Dor neuropática é a dor que surge como consequência direta de uma lesão ou doença que afecta o sistema somatossensorial. A dor neuropática é geralmente uma dor crónica de maior intensidade, induzindo uma maior procura de cuidados de saúde.
A dor neuropática pode localizar-se a qualquer nível do sistema nervoso. Assim, a dor neuropática periférica ocorre quando a lesão ou disfunção primária está localizada no sistema nervoso periférico (SNP). Causas importantes incluem radiculopatia lombar (“ciática”), nevralgia do trigémeo, nevralgia pós-herpética (dor persistente após um episódio de herpes), neuropatia diabética, neuropatia causada por HIV, dor do membro fantasma (após amputação de membro), sequelas de alguns medicamentos de quimioterapia e radioterapia usados no tratamento do cancro e dor crónica pós-cirúrgica.
A dor neuropática central, cuja origem está no sistema nervoso central (SNC) pode surgir após um acidente vascular cerebral (AVC) ou lesão da medula espinhal, na esclerose múltipla ou em outras condições neurológicas e metabólicas.
O circuito neuronal envolvido no processamento da dor é composto por um complexo equilíbrio entre as vias sinalizadoras e moduladoras do estímulo doloroso que estabelecem a ligação entre o SNC e o SNP. A capacidade de transmissão do estímulo doloroso pelo SNP no local da lesão tecidular constitui uma protecção vital contra a ameaça de lesão adicional. A desregulação deste mecanismo protetor por doença, medicamento ou traumatismo pode desenvolver dor crónica.
Os descritores de dor neuropática são um pouco estranhos e, muitas vezes os doentes não sabem que o que sentem é um tipo de dor. Habitualmente existem sintomas desagradáveis, como dor aguda, penetrante, tipo queimadura, ardência ou choque elétrico. Pode ser acompanhada ou não de “formigueiro” ou “dormência” (parestesias) de uma determinada parte do corpo. O diagnóstico também pode ser feito com o auxílio do exame físico, encontrando evidências de lesão nervosa, como sensibilidade reduzida ou aumentada, ou dor em resposta a um leve toque.
A prevalência exata de dor neuropática na população mundial é desconhecida, mas estima-se que 7-8% dos adultos têm actualmente dor crónica com características neuropáticas. A dor neuropática está associada a sofrimento emocional e pior qualidade de vida, afectando a reabilitação, o humor, o sono e o convívio social.
É possível diminuir a incidência, a prevalência e o impacto da dor neuropática tendo em conta os factores de risco gerais, específicos e tratamentos de eficácia comprovada. Os fatores de risco gerais para dor neuropática são semelhantes aos da dor crónica e incluem idade avançada, género feminino, perda de parentes, inactividade física, com evidências crescentes de factores genéticos. Fatores de risco específicos incluem por exemplo diabetes mellitus, cirurgias, infeção por herpes zoster e HIV, entre muitos outros.
Os analgésicos comuns são relativamente ineficazes para a dor neuropática. As directrizes baseadas na evidência recomendam o tratamento com drogas antiepilépticas (por ex. gabapentina ou pregabalina), antidepressivos (por ex. amitriptilina, imipramina ou duloxetina) e/ou preparações tópicas, além de outras drogas. Medidas não farmacológicas incluem terapia cognitivo-comportamental, hipnose e terapias neuromoduladoras. Apesar da existência de vários medicamentos eficazes e das directrizes para o tratamento da dor neuropática,evidências dos Estados Unidos e da Europa sugerem que não são amplamente utilizados e vários casos permanecem subtratados ou não tratados.
Um melhor conhecimento da dor neuropática por parte de doentes e profissionais de saúde resultará em melhor tratamento dos doentes com dor neuropática crónica. A campanha do Ano Mundial contra a Dor Neuropática 2014-2015 foi iniciada a 20 de Outubro de 2014. O objetivo desta campanha é aumentar a consciencialização sobre questões que envolvem este tipo de dor.
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