A Rússia persiste teimosamente na sua aposta total na guerra da Ucrânia. Concentrou aí quase todo o seu poder militar e mobilizou a economia para um esforço de guerra, com o objetivo de conquistar os quatro oblasts do Leste, provocar uma mudança de regime, “desnazificar” e desmilitarizar a Ucrânia.
Enquanto não alcançar esses objetivos, Putin manterá a aparência de querer negociar a paz, mas apenas para discutir temas secundários e manter vantagem tática. A paz, para Moscovo, é usada como instrumento de propaganda.
Esta fixação tem custos elevados. A Rússia tem vindo a negligenciar zonas onde tinha grande influência, como o Médio Oriente, o Cáucaso e a Ásia Central. Ora, como sabemos, a geopolítica não tolera o vazio e outros atores estão a aproveitar.
A China, com a sua paciência estratégica, avança de forma calculada. Os dois grandes eixos do seu plano “One Belt, One Road” passam precisamente por esses territórios. A ausência russa abre espaço que Pequim está a ocupar política, económica e culturalmente.
A Turquia também joga forte. Erdogan procura recuperar influência nas regiões do antigo Império Otomano: Cáucaso, Síria, Golfo, Ásia Central. Simultaneamente, a União Europeia tenta atrair esses países para a sua esfera económica, sem grande ambição política.
Neste novo xadrez global, os EUA, se quiserem conter a China, terão de impedir que esta conclua a sua Nova Rota da Seda. Isso implica coordenar esforços com a NATO, a Turquia e a UE, evitando que Pequim preencha os vazios estratégicos deixados por Moscovo.
A estratégia, como a natureza, abomina o vazio. Onde a Rússia recua, alguém avança. Hoje, é a China. A questão é: quem e com que vontade a poderá travar?
Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

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