Geral Opinião

A responsabilidade de Portugal perante a diáspora e os desafios éticos da migração

A TPA respondeu a André Ventura sobre o discurso do Presidente angolano e a política migratória de Angola, lembrando que, se Portugal acolhe cerca de 60 000 cidadãos angolanos, Angola recebe aproximadamente 200 000 portugueses, sugerindo reciprocidade. Portugal, país de emigrantes, deve ter cuidado com políticas baseadas em confrontos, pois a nossa história de pobreza e emigração nos coloca numa posição de fragilidade externa.

Fora da União Europeia, a diáspora portuguesa é vasta: Moçambique (41 344), Cabo Verde (19 076), Timor-Leste (268) e São Tomé (residual). No Brasil, estimam-se 393 a 513 mil portugueses, e nos EUA mais de 1,4 milhões de pessoas com ascendência portuguesa. Mesmo quando reduzida, a diáspora é essencial para o Soft Power português, criando pontes culturais, económicas e sociais.

A diplomacia e a política interna devem ser coerentes. Medidas internas ou discursos que fragilizem os nossos cidadãos no exterior minam a credibilidade e a proteção da diáspora. Historicamente, Portugal foi envolvido na escravatura, mas também foi pioneiro na consciência crítica e abolição, e filósofos como os autores de Casa-Grande & Senzala procuraram humanizar este passado. Esta miscigenação e reflexão crítica fazem parte da nossa marca identitária.

A política migratória deve ser rigorosa, mas isenta de xenofobia, evitando explorar trabalhadores essenciais, como ocorreu em São Tomé após o fim do escravagismo. Em contextos globais, populismos nacionais e internacionais fomentam formas modernas de escravidão, violando dignidade e direitos humanos. No Iraque, nepaleses e mexicanos protegiam a NATO na Zona Verde com salários miseráveis, enquanto paquistaneses asseguravam a logística em condições extremas.

Ontologicamente, a xenofobia nega a humanidade dos migrantes; eticamente, legitima a exploração e precarização. Reconhecer e combater esta realidade é imperativo para políticas coerentes, justas e respeitadoras, à altura das responsabilidades históricas de Portugal.

Num mundo onde a dignidade humana é fragilizada pelo discurso do ódio, identificar a xenofobia como nova forma de escravidão é o primeiro passo para a justiça que queremos construir.

Nuno Pereira da Silva

Coronel na Reforma 

Acerca do autor

Nuno Pereira da Silva

Coronel de Infantaria na Reserva

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