Geral Opinião

A Diplomacia Disruptiva de Trump e o perigo de uma paz inaceitável para a Ucrânia

Trump muda novamente de posição num comportamento inquietante para o mundo. Na semana passada autorizara o uso de mísseis ATACMS no território russo e impusera severas sanções, mas agora surge com um plano de paz que, de facto e in jure, equivale a uma capitulação total da Ucrânia, sem consideração pelo governo ucraniano nem pela Europa que o apoia. O plano foi discutido entre o seu enviado especial e Moscovo, excluindo Kiev, numa abordagem que rompe com os protocolos diplomáticos tradicionais.

O plano propõe a entrega do Donbass sob aluguer prolongado, a redução drástica do exército ucraniano e a imposição do russo como língua obrigatória. Tal configuração coloca a Ucrânia numa fragilidade extrema, exige concessões territoriais permanentes e altera internamente dimensões culturais e linguísticas essenciais à sua soberania. Pedir a um Estado invadido que aceite estas condições é exigir a amputação da sua própria existência como Estado.

A diplomacia disruptiva, conceito que caracteriza esta abordagem, rompe com a diplomacia clássica assente em negociações multilaterais, previsibilidade normativa e respeito pela soberania dos envolvidos. Negociações bilaterais excluindo os atores principais, uso frequente do efeito surpresa, marginalização de parceiros e alternância entre firmeza militar e propostas conciliatórias frágeis definem um estilo político singular, profundamente pessoal e imprevisível.

Trump tem alternado entre posições de pragmatismo e reconhecimento da capacidade de resistência da Ucrânia, mas permanece um estilo volátil, marcado por negociações paralelas e personalização extrema da política externa. A diplomacia disruptiva revela-se assim como um fenómeno político único, que merece estudo académico, não apenas como anomalia, mas como expressão de poder híbrido e relacional no século XXI, onde legitimidade, ética e força se interligam.

Um plano de paz autêntico deve restaurar justiça e segurança, não recompensar o agressor nem enfraquecer a vítima. A proposta de Trump compromete a soberania ucraniana, condiciona a Europa e ignora a dignidade dos Estados. Compreender a diplomacia disruptiva é essencial para antecipar os seus efeitos e repensar a arquitetura conceptual da política internacional.

Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma