Geral Opinião

Os analistas políticos não são astrólogos

No seguimento do que afirmei ontem acerca dos comentários políticos, estratégicos e táticos sobre as guerras em curso, o que fazemos como comentadores é pegar nas informações que temos e tentar, com base nelas, traçar vários cenários possíveis e apontar qual, em nossa análise, é o mais provável que venha a acontecer.

Traçar cenários, hipóteses ou modalidades de ação é sempre algo difícil, e mais difícil é traçar a mais provável, que todos os analistas tentam descortinar. No entanto, de todos os que levantamos há sempre um mais perigoso, que não devemos alienar. Em termos de planeamento estratégico, operacional ou tático, normalmente planeamos para o mais provável, salvaguardando o mais perigoso.

As análises dos cenários, hipóteses ou modalidades de ação são feitas sempre de acordo com as ferramentas de análise que utilizarmos, que devem ser o mais abrangentes possível, e que vão da História ao Direito, às Relações Internacionais, à estratégia, à psicologia dos intervenientes e à sua lógica de pensamento, e ao nosso faro ou intuição, que difere de analista para analista. No fim ao cabo, usa-se o método científico para tentar descobrirmos a solução, com várias hipóteses, cenários ou modalidades de ação, e fazer um estudo integrado, sempre conduzido pela geografia e pelo terreno, que tudo condicionam.

O planeamento parametrizado já ajudava este ciclópico trabalho, que hoje em dia, com a IA, pode ser muito agilizado e poderá fazer o estudo integrado com vários cenários, hipóteses ou modalidades de ação, desde que os especialistas deem os inputs certos e verifiquem o resultado, ou seja, pode fazer um estudo matricial completo e complexo, com várias variáveis e várias combinações. A política, a estratégia e a tática estão mais previsíveis, no entanto sempre com a capacidade de julgamento dos especialistas.

Usei pela primeira vez as ferramentas eletrónicas existentes na NATO para planeamento de forças há cerca de 25 anos, introduzindo cenários num computador que usava os nossos parâmetros para calcular as capacidades necessárias para os diferentes cenários geográficos em que podíamos atuar. O resultado foi impressionante. No entanto, passámos meses a analisar os resultados, a depurá-los, até introduzir os nossos conhecimentos, experiências e perceções que a máquina não dava, nem podia dar, e esta era e é a utilização certa da IA como ferramenta e ampliação das nossas capacidades, sem as substituir, mas também sem as desprezar, pois quem não aprender a utilizá-la fica iletrado e ultrapassado muito rapidamente.

Adriano Moreira aconselhava os seus alunos a fazer análise prospetiva num longo prazo. Dizia ele que, dessa forma, caso a nossa visão prospetiva não se realizasse, ou já cá não estaríamos, ou já ninguém se lembraria, e não seríamos motivo de eventual crítica satírica.

Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

Acerca do autor

Nuno Pereira da Silva

Coronel de Infantaria na Reserva

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