Desde o início do seu mandato, Donald Trump não escondeu o seu fascínio pela Groenlândia. Recorde-se o episódio quase caricato em que anunciou o desejo de comprar a ilha à Dinamarca, proposta recebida com incredulidade em Copenhaga. Pouco depois, a sua esposa planeava uma viagem privada de turismo à região, e na sequência, foi o próprio Vice-Presidente dos EUA a aterrar em Nuuk, oficialmente em visita política. Ficou claro que o “turismo” não era inocente: tratava-se de preparar terreno.
Hoje, o assunto regressou à ribalta. Três cidadãos norte-americanos, próximos de Trump, foram apontados como promotores de movimentos separatistas na Groenlândia, incentivando a fragilização da ligação histórica entre a ilha e a Dinamarca. O governo dinamarquês reagiu de imediato e convocou o encarregado de negócios dos EUA em Copenhaga. A questão deixou de ser apenas de retórica: passou ao plano das operações de influência.
Esta estratégia encaixa-se em três passos clássicos:
- Separação – fomentar ressentimentos históricos, explorar feridas coloniais, incentivar o discurso da autodeterminação.
- Mudança de regime – apoiar discretamente lideranças locais favoráveis a Washington, aproveitando vulnerabilidades eleitorais e políticas.
- Integração – transformar a dependência económica e militar em estatuto político, até se tornar possível imaginar a Groenlândia como mais uma estrela na bandeira americana.
Trump encontra-se no primeiro passo, mas a direção é clara: a ambição de tornar a Groenlândia parte dos EUA. A diferença de métodos não deve esconder a semelhança estratégica: tal como a Rússia começou pelo Donbass, Trump começou pela influência. O objetivo final é o mesmo, alterar fronteiras e mudar equilíbrios geopolíticos pela força, direta ou indireta.
Nuno Pereira da Silva
Coronel na Reforma

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