Há cerca de trinta anos, estive em Cooperação Militar em São Tomé e Príncipe, numa unidade de Instrução Militar. Num determinado dia o comandante da unidade referiu-me, ao início dos trabalhos da manhã, que um recruta tinha desertado, pelo que eu, na minha ingenuidade, referi-lhe quais eram os procedimentos legais, que deveria utilizar, a partir desse momento.
No outro dia de manhã, o comandante da Unidade levou-me a visitar a prisão da mesma. Um casebre fechado ao sol tórrido, e disse-me sorrindo, que lá dentro estava a família mais chegada do recruta desertor, pelo que tinha a certeza de que este brevemente se apresentaria na unidade.
Recordo-me de ter ficado primeiro surpreendido, e de seguida, de me ter zangado com o Comandante da Unidade de Instrução, dizendo-lhe que o seu comportamento neste caso era inqualificável e, que era um atentado aos direitos humanos, prender inocentes e utilizá-los como reféns, ou seja, como forma de obrigar o recruta-desertor a apresentar-se na unidade. De pouco me serviu ter-me exaltado, que a família do recruta-desertor lá continuou presa, até à apresentação do mesmo na unidade, algo que realmente não tardou.
A detenção da mulher de João Rendeiro, com um pouco mais de sofisticação e argumentário mais sólido e sofisticado, do ponto de vista legal, é em minha opinião, muito semelhante à da prisão do recruta-desertor, ou seja, está detida para ver se o marido regressa a Portugal, e se se apresenta voluntariamente obrigado às autoridades, para cumprir a pena de prisão efetiva, que já lhe foi aplicada.
Nuno Pereira da Silva
Coronel de Infantaria na Reserva
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